quarta-feira, 26 de março de 2008

PARTE 1




Fazia muito tempo que eu não sentia tanta dor ao ver uma paciente sofrendo...
Acredito que tenha sido por me identificar com ela pelo fato de ser mãe.
A paciente tem 80 anos, uma estrutura física normal, até um pouco encorpada. O corpo parece de alguém com uns 50 anos, a cara de 60 e a súplica tinha uns 100 anos ... Mas a dor ... Parecia tão dilacerante que afetou a mim e minhas colegas, ficamos até a troca de plantão ao lado dela...
-Quero ver meu filho, preciso ver meu filho!!(Lágrimas, expressão de dor) Ele está precisando de mim, quero ficar do lado dele, nessa vida sempre ficamos juntos, nunca nos separamos, quero ir vê-lo... (Levantou da cama, se vestiu e queria ir embora de qualquer jeito).
Ela está com câncer de endométrio, veio por sangramento, ficou na UTI e agora está no quarto. Ela tem sonda para urinar e uma espécie de acesso direto a medicações próximo ao pescoço. A médica (foi chamada com urgência) vendo o estado de agitação da paciente prescreveu uma medicação forte para acalmá-la. Fez efeito por apenas 30 minutos. A dose era para derrubar leão , como dizem.
Que força é esta que impulsiona muitas mães? Que faz o medicamento não fazer o efeito esperado... Peguei a pasta da paciente e liguei para um número de uma vizinha...
Ela me disse que a irmã da paciente iria visitá-la hoje e que não tinha vindo ontem porque tinha tido alguns problemas com uma “papelada”... Falei da agitação da paciente e da vontade dela de ver o filho.
- O filho dela está internado em um hospital psiquiátrico da cidade pois tentou agredir a mãe várias vezes, algumas eu até presenciei...mas avisa ela que ele está bem-desabafa a vizinha.
Fui lá e contei que o filho estava bem , que havia falado com a Rita...etc...etc..
-Ela não gosta do meu filho, só eu conheço ele, eu sei que ele está sofrendo muito agora, quero ir lá, pegá-lo, levar para casa , ficar com ele e não sair mais de casa. (Choro intenso)
Voltei para casa com o peito dolorido por segurar o choro... Pensei em nunca mais entrar em quarto algum, pensei em dar uma de Patch Adams e promover o encontro dela com o filho...
Depois, um pouco recuperada do impacto desta história, imaginei como teria sido a vida da dupla mãe-filho... Muitas possíveis histórias foram se formando... Mas acredito que no próximo plantão eu tenha mais notícias dela e de preferência: que ela esteja bem para poder ver o filho. O que é provável , tamanha a força de seus sentimentos.

segunda-feira, 24 de março de 2008

...a morte anda sumindo dos meus plantões..fazendo festa nos dias em que não trabalho...

terça-feira, 18 de março de 2008


Lembro de uma paciente muito simpática, de uns 32 anos, câncer de mama, dois filhos lindos e um marido apaixonado. Descobriu o câncer enquanto amamentava o seu filho mais novo, ele vomitava toda vez que ela lhe dava o peito... Preocupada, foi até um posto de saúde e o médico disse que ela estava com má vontade, que não existia a possibilidade do bebê não gostar...blá blá blá...etc... Um dia ela percebeu que estava com “bicheira”, a proliferação de larvas de mosca no seu seio... ou seja, muito tarde... Foi ao médico novamente e descobriu o diagnóstico: câncer de mama, com possibilidade de metástases.
A primeira vez que a vi, ela acabara de fazer uma mastectomia radical na mama esquerda. Ela parou em frente ao balcão que eu estava e começou a falar, de forma muito alegre, como o marido estava abalado com sua doença. Ela estava em sala de cirurgia , teve uma parada cardíaca, foi reanimada e voltou a vida. O marido, sabendo das complicações, rezava na recepção do hospital... Quando disseram que ela estava bem, se ajoelhou, juntou as mãos em oração e disse: -Obrigada meu Deus, como amo minha mulher!!!
Ela estava toda orgulhosa de ter um marido tão preocupado, visto que o passado dele era de drogas... Ela havia ajudado na reabilitação dele. Ela era a força da família.
Um dia a sogra dela ligou para o hospital e perguntou do filho, pois ela estava fazendo quimioterapia em outro hospital (câncer de útero). O filho precisava cuidar dos netos para ela sair. Estas histórias são de uma realidade tão dura, que ás vezes parecem até irreais. Mas não eram.
Nas semanas que se seguiram ela continuava tendo muitas dores no braço, pela retirada dos gânglios acredito... O médico resolveu pedir uma biópsia em um nódulo do outro seio... suspeita de metástase...
Lembro bem da cara do médico quando perguntei: E a fulana? Como está? Ele me respondeu: Ela me abraçou hoje pela manhã, porque a biópsia não havia detectado nada maligno.
Tirei férias de 20 dias, feliz com a notícia, pois acabei me aproximando desta mulher simpática (eu e a equipe toda), de uma vivacidade invejável, ela era um SORRISO.
Quando voltei, fui conferir as pacientes da UTI e levei um choque: ela estava em uma das camas... Entubada... Era a reta final na luta contra o câncer. Fiquei muito abalada... e antes de eu terminar meu plantão, o câncer venceu a batalha: ela estava morta! Nestas horas considero meu trabalho muito difícil, tive que providenciar o atestado de óbito e ver aquele corpo, que antes era tão vivo, perdendo a cor, enrijecendo... Acabou.
E os filhos pequenos?
E o marido como estará?
E a sogra, que poderia apoiar afetivamente o filho e os netos? Já estaria também em fase terminal?
(Imagem: Tchello d'Barros)
Esta história vai para Evelyn, estudante de enfermagem.
Evelin, essa história eu não tinha contado ainda por me ser muito dolorida, mas é bom poder compartilhar com alguém da mesma área. Abraço

terça-feira, 4 de março de 2008


Desta vez foi uma gorda de mais de 200kg...

Nunca imaginei o trabalho envolvido na remoção do corpo... Muito impactante também ver uma pessoa com um pouco mais de 40 anos morrer de doenças decorrentes da obesidade mórbida.Imagem inesquecível: o corpo ficando azulado, perdendo a vida...
Detalhe importante: a dieta da paciente era hipossódica(pouco sal) A paciente ciente desta prescrição já trazia seu sal de casa...
Suicídio?!